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PROFESSOR SEBASTIÃO DE SÁ: LEMBRANÇAS DE UM HONORÍFICO COMENDADOR

Por ROSÂNGELA FELIPPE, jornalista



Destacado pelo seu inesgotável interesse pela Educação e pela Comunicação, Comendador Sebastião de Sá foi um marcante professor e jornalista que irrompeu de maneira substancial na história de Guaxupé. Marcos Noronha, seu amigo, dizia: “a inteligência do professor Sebastião de Sá chega a esbarrar no gênio”. Seu Zizinho, como todos o chamavam, raramente fazia uso de dicionário, tamanho o seu conhecimento da etimologia das palavras.

Nascido em 18 de novembro de 1908, era jacuiense. Filho de Sr. José de Sá e de Dona Amélia de Sá, teve seis irmãos: Ana, Elila, José, Carolino, João e Joel de Sá. Foi casado com Dona Isabel Silva de Sá, mais conhecida como Dona Bela, com quem teve cinco filhos: José Felipe (Advogado / Falecido), Maria Inês (Professora), Sebastião (Apelido Tuti / Engenheiro Mecânico), Marcos Felipe (Médico) e Fernando (Dentista / Falecido). Hoje, somam-se 10 netos e 16 bisnetos.


Há poucos registros referentes à sua formação escolar. Sabe-se que frequentava a Escola do Professor José Gonela onde trabalhava como bedel. Iniciou curso de Direito, em São Paulo, mas precisou abandonar os estudos por questões familiares. Contudo, sabe-se que se tornou autodidata. Assim, estudando sozinho, tornou-se um admirável formador de opiniões e foi abertamente respeitado por todo conhecimento que adquiriu e transmitiu ao longo de sua vida.



Contando com o apoio de seus filhos, esta coluna buscou resgatar um pouco da memória de Seu Zizinho, um nome assinalado pela proeza de lutar sem descanso pela cultura e pela boa formação do povo guaxupeano. As respostas da entrevista foram redigidas por Sebastião de Sá Filho, o Tuti.


Como foi a infância do professor? É fato que quando menino ajudava nos afazeres do dia a dia, como, por exemplo, buscar lenha para a mãe cozinhar para toda a família?

Certamente, o fato de ter poucas escolas e a falta de recursos para educar os filhos àquela época devia ser muito difícil. Nossa avó Amélia fazia serviços domésticos na casa de terceiros e o nosso pai ajudava fazendo o trabalho de “office-boy”. Era uma peleja, como se diz.


Ele já gostava de ler e escrever desde a mais tenra idade? Como descobriu o dom de criar versos?

Escrever era uma de suas paixões. Não havia noite, ao se deitar, que não tinha uma caneta e um pedaço de papel para escrever: um poema, uma poesia, uma pauta para o jornal, etc. Por ser autodidata é aquela historia de: “saber ler, entender, traduzir sem ter o aprendizado oficial dessas coisas”.



E o início do namoro com Dona Isabel Silva de Sá? Parece que tudo começou com as visitas que ele fazia à família de Dona Bela e a jovem lhe servia doces e salgados gerando os primeiros flatters. Foi mesmo assim ou houve outros meios que favoreceram o namoro que os levou ao casamento?

Ainda muito jovem, o Seu Zizinho foi professor da maioria das moças de Guaxupé que estudavam no Colégio das Freiras (Imaculada Conceição) onde nossa mãe estudava e se formou. Com certeza era um bom partido. Devem ter se conhecido daí e depois para o namoro.


Seu Zizinho começou a trabalhar muito cedo para manter seus estudos. Como foi a fase em que ele, entre outras tarefas, abria e fechava as portas da Academia de Comércio de Guaxupé cuidando da ordem do estabelecimento?

Sim, ele dava expediente na Academia São José, provavelmente nos serviços da secretaria. Era muito habilidoso para isso. Fazia também serviços de contabilidade para empresas. Com isso amealhava alguns trocados.


Como foi a juventude dele? Sempre a viveu em Guaxupé?

Além de Guaxupé, chegou a morar em Campinas e São. Paulo. Voltou para Guaxupé por questões familiares com a morte de sua irmã mais velha, Ana Bastos. Gostava muito de futebol e não deixava de acompanhar os acontecimentos da época em Guaxupé, da AAG, Aero Clube.


O relacionamento com os pais e irmãos seguia normas tradicionais típicas das famílias mineiras?

Sim, principalmente com a sua família para que os filhos se mantivessem unidos. Em sua Resolução Testamentaria, escreveu em 1979: “conserve unidos os meus filhos como sempre viveram em torno de sua mãe e inspirados na modéstia com que engrandeceram a nossa vida e na beleza com que cumpre, cada um deles, o seu dever”.


Dona Amélia, mãe dele, viveu até idade avançada mantendo notável simpatia, lucidez e cordialidade. O que ela representava na vida de Seu Zizinho como exemplo de vida?

Dona Amélia era idolatrada por ele. Basta dizer que em sua lápide mandou gravar: “não é túmulo. É altar”.


Ele era um homem consideravelmente desapegado de bens materiais. Não se importava com luxo e não fazia do dinheiro o bem mais importante de sua vida. Poderíamos considerá-lo um homem cuja alma se alimentava de estudos e escritas?

Tinha um emprego no serviço público de alta relevância, como Inspetor Federal de Ensino. Realmente, não tinha muito apego ao dinheiro. Era um “workaholic”(pessoa viciada em trabalho), como se diz. Não temos lembrança dele ter tirado férias para o lazer. As questões financeiras eram da competência da Dona Bela. Ela cuidava desta parte. Afinal, ela tinha sangue libanês.


Seu Zizinho era franzino, mas não deixava de ser um homem dinâmico e sempre às voltas com o jornal que lhe consumia horas intensas de trabalho. De onde ele tirava tanta energia? Seria do amor pelo ensino e pelo jornalismo?

O seu biotipo era de um homem franzino. Na verdade, no ano de 1949, quando tinha 40 anos, foi submetido a uma gastrectomia(retirada de parte do estomago) por conta de uma úlcera gástrica sangrante. Por sorte tinham sido inauguradas, semanas antes, as viagens aéreas de Guaxupé para São Paulo, para onde foi levado às pressas. Não fosse isso, com certeza não teria sobrevivido. Como se tratava de cirurgia usando técnicas pioneiras, na época, o pós-operatório era muito rigoroso e prolongado. Ele se habituou às dietas limitadas Por conta deste período de pós operatório longo, nossa mãe teve que acompanha-lo e nós filhos pequenos ficamos por conta de nossas famílias, os Sá, os Felippe e amigos.


Jornal “Folha do Povo”, um marco na cidade de Guaxupé. Como foi a criação do veículo? Por quando tempo circulou e como Seu Zizinho o mantinha em evidência mesmo nos momentos em que havia poucos recursos para preservá-lo em funcionamento?

A Folha do Povo foi criada em abril de 1931. Guaxupé estava sem jornal já que deixou de circular o “Cidade de Guaxupé”, do Sr. Álvaro Toledo, onde o Seu Zizinho era redator. No princípio eram ele e o seu irmão Dunga (a quem adorava). O tio Jorginho Felippe também entrou na sociedade. O jornal circulou por 75 anos, 54 enquanto viveu e 21 após a sua morte.


Há relatos de que ele, muitas vezes, tirou dinheiro do próprio bolso para que o jornal continuasse a existir e a bem servir a população. Será que nos dias de hoje encontramos idealistas de comunicação com o mesmo perfil de Seu Zizinho?

Todos sabem como é difícil manter um jornal, principalmente no interior. Tem situações que não têm jeito. Ai tinha que tirar o dinheiro do próprio bolso como fizemos nos últimos anos, após a sua morte. Nos nossos dias é difícil, mas com certeza ainda existem pessoas idealistas neste sentido.


Uma pergunta abelhuda. Com o fechamento da “Folha do Povo”, foi como ver Seu Zizinho partir outra vez?

Acho que cumprimos o nosso papel enquanto nos foi possível e acredito que ele ficaria orgulhoso disso. Foi realmente muito difícil. Como todo jornal, grande ou pequeno, o caminho hoje é a digitalização.


E quanto ao professor Sebastião de Sá? Ensinar para ele também era devoção assim como o jornalismo. Quais os maiores feitos que ele realizou como educador?

Do ponto de vista profissional, foi mais educador do que jornalista. Como educador teve papel relevante na época, junto a Diretoria de Ensino Secundário, do Ministério da Educação. Participou do grupo de implantação, da Reforma do Ensino Secundário, promovida melo MEC, que se fez na década de 60, tendo acumulado por bom tempo, a Inspetoria de Belo Horizonte e Três Corações. Através dos Cursos da CADES, que realizava em Guaxupé, incentivou e promoveu a formação de milhares de professores do ensino médio nas diferentes áreas do conhecimento, tais como: matemática, português, letras, historia, geografia. Participou ativamente na criação de inúmeros Ginásios e Colégios no Sul e Sudoeste Mineiro. Mas o feito maior e do qual sentia orgulho e do qual foi o principal artífice foi a criação da Faculdade de Filosofia de Guaxupé. Um feito na época. No seu inicio, a secretaria da Faculdade funcionava no escritório dele lá em nossa casa. A Marieta Ribeiro, que foi a primeira secretária da Faculdade, vai se lembrar disso! Portanto, a Faculdade foi a sua maior empreitada, juntamente com o então prefeito, Benedito Felippe da Silva e o Monsenhor Marcos Noronha, que na época, respondia pela Diocese de Guaxupé. Sabia o que estava fazendo. Até a forma de idealizar o plano que muitos não acreditavam. Foi dele a ideia de criar a Fundação Educacional de Guaxupé como mantenedora da Faculdade e estabelecer a parceria entre o Bispado e a Prefeitura de Guaxupé. Não faltaram, é claro, o espírito empreendedor do prefeito Benedito Felippe da Silva e a extrema colaboração da Diocese.


Quais foram os seus deveres como Inspetor Seccional?

Fazia visitas periódicas às escolas sob sua jurisdição com o principal objetivo de promover e tentar melhorar a qualidade do ensino das escolas da região. E assim o fazia com grande aptidão e maestria.

Além de ser um professor de aprimorado teor didático, como Inspetor Seccional Seu Zizinho conseguiu angariar bolsas de estudos para muitos estudantes da cidade. Essa dedicação aos menos possibilitados de pagar estudos comprovava o seu grande espírito humanitário. Ele gostaria de ter podido fazer mais pelo ensino?

Existia um programa do MEC para concessão de Bolsas de Estudos e ele coordenava a alocação deste recurso para quem realmente precisava. Não só aqui em Guaxupé, mas para todos os ginásios da região que não pertenciam ao governo do Estado.


Ele recebeu o título de Comendador. O que vem a ser esse designativo no contexto social e como foi o seu desempenho incorporado a essa denominação?

É uma insígnia concedida pelo Vaticano para aqueles que prestam relevantes serviços à Igreja Católica. Foi um prêmio que recebeu pelo seu trabalho e por sua fé católica. Gostava de ser chamado de “Comendador”. Além da Comenda do Vaticano, foi também agraciado com a MEDALHA DA INCONFIDÊNCIA, a mais alta condecoração concedida pelo Governo de Minas às suas autoridades e benfeitores. Na época era para poucos. Salvo engano, aqui em Guaxupé, acho que é o único cidadão a deter esta honraria.


Religioso, Seu Zizinho não faltava a uma só missa aos domingos. Essa prática ele transmitiu aos filhos?

Acredito que sim, mas não com a mesma intensidade, é claro! Não era só aos domingos, não! Comungava diariamente! Não faltava um só dia, estivesse onde estivesse. Nós, os filhos, mantivemos essa fé cristã e católica que ele nos passou, felizmente! Nossa irmã, Maria Inês, que é muito praticante, com certeza é a que está mais perto de alcançá-lo na sua devoção.


Como pai de família, foi um homem que muito orgulho teve dos filhos. Como avô foi idolatrado deixando grande saudade no coração de todos. Soube reconhecer o valor da leal e dedicada esposa, Dona Bela. Foi um homem que realmente soube amar e transmitir afeto também aos sobrinhos. Como seria o mundo se todos fossem como ele?

Foi uma pessoa admirada como poucos. Antônio Rola, o querido Japão, que era dono da barbearia frequentada pela elite política da cidade, só o chamava de “Mestre Ziza”. O Radialista Kaled Cury se referia a ele como o “Mestre dos Mestres”. Certamente, devia ter os seus desafetos. Mas era unanimidade pela sua bondade, humildade e inteligência. É o que dizem as pessoas que tiveram o privilégio de conhecê-lo. E nós filhos só temos que nos orgulhar do pai que tivemos e que até hoje nos enche de saudades e gratidão! Uma verdadeira lição de vida para os netos, bisnetos e as gerações que nos sucederem.E, sempre pensando na família, em 1973, em uma de suas poesias que chamou de a ‘Nossa Casa’, escreveu: “Na ventura que bem algum suplanta:Uma esposa que é mulher e é santa; E o carinhoso amor de cinco filhos!

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