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MARCELO ZAIAT, O GUAXUPEANO QUE COLABORA COM A RECUPERAÇÃO DAS ÁGUAS

Por ROSÂNGELA FELIPPE, jornalista


Marcelo Zaiat deu início à trajetória escolar na terra natal (Guaxupé), tendo frequentado o Colégio Imaculada Conceição (pré-escola), Grupo Escolar Barão de Guaxupé e Escola Estadual Dr. Benedito Leite Ribeiro. Saiu da cidade aos 17 anos para estudar no Rio de Janeiro e, em 1986, mudou-se para São Carlos (SP) onde prosseguiu com os estudos e vem construindo brilhante carreira profissional.

Com graduação e mestrado em Engenharia Química pela Universidade Federal de São Carlos; doutorado em Engenharia Hidráulica e Saneamento pela Escola de Engenharia de São Carlos e Livre Docência na área de Tratamento Biológico de Águas Residuárias pela USP, o guaxupeano foi membro da Coordenação de Área de Engenharia (Engenharia II) da FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) e do Comitê de Assessoramento de Engenharia e Ciências Ambientais do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico). Foi, também, pesquisador de Laboratório Associado junto ao Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE – atual Laboratório Nacional de Biorrenováveis – LNBR) do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM).

Atualmente:

- Professor Titular junto ao Departamento de Hidráulica e Saneamento da Escola de Engenharia de São Calos (EESC) da Universidade de São Paulo (USP).

- Editor na área de Engenharia Ambiental do periódico Brazilian Journal of Chemical Engineering.

- Professor do curso de graduação em Engenharia Ambiental da EESC/SUP e vice-coordenador e orientador permanente de mestrado e doutorado junto ao Programa de Pós-Graduação em Ciências da Engenharia Ambiental (EESC/USP) na linha de pesquisa em Biotecnologia Ambiental.

- Desenvolve pesquisas na área de Tratamento Biológico de Águas Residuárias, atuando, principalmente, nos seguintes temas: desenvolvimento de biorreatores anaeróbios e aplicação do conceito de biorrefinaria a estações de tratamento biolótico de águas residuárias.

- Membro da Diretoria da Adusp (Associação de Docentes da Universidade de São Paulo), como Diretor Regional de São Carlos (Gestão 2021/2023).


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EM QUE MOMENTO VOCÊ DESCOBRIU QUE DEVERIA SE DEDICAR À ENGENHARIA QUÍMICA, ENGENHARIA HIDRÁULICA E SANEAMENTO?

Eu me decidi por Engenharia Química quando estava no ensino médio, mas não estava completamente seguro de minha escolha, pois também gostava muito da área de humanas, principalmente Letras. Entrei na Universidade com 17 anos e obviamente não conhecia completamente o curso, como ocorre com a maioria dos jovens obrigados a tomar uma decisão muito cedo na vida. Felizmente, adaptei-me bem ao curso e, ao final da graduação, decidi-me que seguiria a carreira acadêmica, ingressando no mestrado em Engenharia Química. A escolha pela área de Saneamento deu-se apenas no doutorado, quando já estava mais maduro profissionalmente.


QUAIS AS CONTRIBUIÇÕES QUE SUA ÁREA PROFISSIONAL DISPONIBILIZA PARA A RECUPERAÇÃO DAS ÁGUAS RESIDUÁRIAS?

Hoje atuo na área de Engenharia Ambiental e Saneamento. É uma subárea dentro dessa nova habilitação e Engenharia que não existia quando prestei vestibular. Antes existia apenas a Engenharia Sanitária, mas eram poucos os cursos no país. Atuo, principalmente, na área de tratamento de águas residuárias e o objetivo principal é devolver ao ambiente as águas usadas em processos industriais e esgotos sanitários gerados em residências, com o menor impacto ambiental possível. Atuo, também, na obtenção de produtos e energia a partir das águas residuárias, tornando-as matérias-primas para um processo biotecnológico industrial. Dessa forma, buscamos aliar a proteção ambiental, com a recuperação de materiais e energia.


EXISTE ALGUM GRAU DE CONTAMINAÇÃO DA ÁGUA O QUAL A CIÊNCIA AINDA NÃO ESTEJA HABILITADA A SUPRIMIR O PROBLEMA?

Existem vários problemas ambientais ainda sem solução definitiva e o papel do pesquisador nessa área, que é o meu caso, é buscar soluções para tais questões. No caso da poluição ou contaminação das águas há, por exemplo, o que chamamos de micropoluentes ou poluentes emergentes. São fármacos, produtos de limpeza, cosméticos, entre outros, que despejamos no ambiente via rede de esgoto sanitário ou nos processos produtivos industriais. Tais compostos estão em baixíssimas concentrações, porém já há estudos que atestam severos impactos ambientais causados por muitos desses compostos, além de problemas à saúde humana. Há, também, os agrotóxicos que podem chegar aos cursos d’água carreados do solo pela chuva, por exemplo. Muitos afetam o ambiente de forma severa e ainda não há sistemas viáveis ou eficientes para remoção da maioria dos compostos. Em suma, há vários poluentes e contaminantes para os quais não temos tecnologia para minimizar o impacto causado pelo lançamento no ambiente.


COM O CONTÍNUO CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO MUNDIAL, INÚMERAS COMUNIDADES VÃO SE CRIANDO PRÓXIMO AOS LOCAIS MUNIDOS DE ÁGUA PELA PRÓPRIA FORMAÇÃO NATURAL. COMO ESTA HABITUDE PODE CAUSAR EFEITOS NEGATIVOS SOBRE A VIDA AQUÁTICA E SOBRE A SAÚDE HUMANA SEM OS EXERCÍCIOS DA ENGENHARIA AMBIENTAL?

Grande parte da água doce no mundo está severamente comprometida pela poluição, geralmente decorrente do despejo dos esgotos industriais e domésticos nos cursos d’água ou do carreamento de compostos utilizados nas atividades agrícolas. Além do comprometimento da biota aquática, com consequente desbalanceamento ecológico, a atividade humana leva ao comprometimento dos diversos usos que fazemos da água. A urbanização desenfreada e desestruturada, bem como a adoção de métodos produtivos industriais e agropecuários sem qualquer comprometimento ambiental, levam ao desequilíbrio ecológico, o que pode causar danos ao meio. A Engenharia Ambiental traz um olhar amplo sobre o ambiente, sempre com o objetivo de, de forma sistêmica, buscar soluções para evitar ou ao menos minimizar os impactos no meio.


RELATE SUAS EXPERIÊNCIAS COMO PROFESSOR TITULAR JUNTO AO DEPARTAMENTO DE HIDRÁULICA E SANEAMENTO DA ESCOLA DE ENGENHARIA DE SÃO CARLOS (EESC) DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (USP).

O trabalho de docente e pesquisador em uma Universidade Pública é muito estimulante, prazeroso e complexo, já que envolve não só o oferecimento de disciplinas para os cursos de graduação e de pós-graduação, mas trata-se de um trabalho mais amplo, envolvendo ensino, pesquisa e extensão. Como docente, trabalho em regime de dedicação exclusiva (denominado na USP de RDIDP – Regime de Dedicação Integral à Docência e à Pesquisa), o que significa que tenho que me dedicar integralmente à Universidade. Esse regime, no qual está a grande maioria dos docentes das Universidades Públicas no Brasil, permite que o/a profissional integre ensino, pesquisa e extensão universitária. Essas atividades são indissociáveis em uma Universidade que entenda o ensino como um processo, a extensão como a ponte com a sociedade e a pesquisa como atividade mediadora e que alimenta as outras duas. Na área de pesquisa, orientamos estudantes de mestrado e doutorado, buscando a formação de novas pesquisadoras e novos pesquisadores. Estou profissionalmente na Universidade desde 1993, incialmente como docente da Fundação de Ensino e Pesquisa do Sul de Minas (Varginha), com rápida passagem pelo Instituto Mauá de Tecnologia e, desde 1998, como docente da USP. Minha experiência tem sido muito rica e me considero um aprendiz sempre. Talvez, seja essa a grande vantagem do trabalho em pesquisa científica. Quanto mais conhecemos, mais compreendemos que há muito mais a avançar no conhecimento e nos damos conta que sabemos muito pouco ainda.


SENDO EXTENSAMENTE CONVIDADO PARA MINISTRAR PALESTRAS, QUAIS OS TEMAS MAIS ABORDADOS DURANTE SUAS PRELEÇÕES?

Geralmente me convidam para falar de minhas pesquisas e de meus projetos em andamento. No entanto, muitas vezes sou convidado para falar sobre ensino ou sobre política universitária. As palestras são atividades de extensão de extrema importância para levarmos para fora da Universidade ou para outras Instituições um pouco do que ali é gerado.


OCUPANDO O CARGO DE VICE-COORDENADOR E ORIENTADOR PERMANENTE DE MESTRADO E DOUTORADO JUNTO AO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA ENGENHARIA AMBIENTAL (EESC/USP), COMO VOCÊ DESCREVE A ENGENHARIA AMBIENTAL EM SEU DEVER DE REDUZIR OS IMPACTOS SOFRIDOS PELO MEIO AMBIENTE?

As atividades de gestão universitária também são obrigatórias aos docentes das Universidades Públicas, já que coordenações e chefias são ocupadas por docentes em atividade, com escolha entre os pares. A coordenação de cursos, seja de graduação ou pós-graduação, extrapola a função puramente burocrática, já que cabe a coordenadores e coordenadoras a condução pedagógica dos cursos, bem como o aprimoramento dos projetos. Já assumi a função de coordenação de cursos em diferentes momentos de minha carreira e certamente é das atividades mais prazerosas e que traz muito aprendizado pelo intenso contato que a função exige com o corpo docente e discente da Universidade. Como respondi anteriormente, a Engenharia Ambiental ainda é uma habilitação jovem no Brasil e no mundo. O primeiro curso no Brasil é da década de 1990 e o nosso da EESC/USP tece início em 2003. A ideia básica é capacitar profissionais aptos a enfrentar o desafio de buscar uma sociedade mais sustentável, conjugando questões ambientais e sociais. Já o desafio nosso, como docentes, é formar cidadãos e cidadãs conscientes de seu papel transformador na sociedade. Eu acredito muito na Universidade como transformadora de pessoas e da sociedade, ainda que esse sonho esteja um pouco distante em um país tão desigual socialmente como o nosso e que ainda não permite um acesso universal ao ensino superior de qualidade.


AS QUEIMADAS QUE CASTIGAM IMPIEDOSAMENTE O SOLO DE VÁRIAS REGIÕES DO PAÍS, OBVIAMENTE PREJUDICAM MANANCIAIS. HÁ COMO RECUPERAR ESSAS FONTES DE ÁGUA POR MEIO DA ENGENHARIA AMBIENTAL, OU SÃO DANOS IRREVERSÍVEIS?

Obviamente, o melhor seria a prevenção. No entanto, na maioria dos casos, há possibilidade de recuperação da qualidade das águas, o que fica mais difícil e mais caro quanto maior for a severidade do dano. As ações humanas, como as queimadas, impactam solo, ar e água e a recuperação é geralmente lenta. As tecnologias atuais podem certamente auxiliar no restabelecimento do equilíbrio, porém podemos chegar a pontos críticos, a partir dos quais o equilíbrio natural pode não ser mais restabelecido, levando a danos permanentes em uma determinada região. É importante ter em mente que os impactos ambientais não são somente localizados e restritos a uma região. Muitas vezes os danos são globais, como os que vemos associados às mudanças climáticas.


COMO PESQUISADOR NA ÁREA DE TRATAMENTO BIOLÓGICO DE ÁGUAS RESIDUÁRIAS, VOCÊ ACREDITA QUE, ALÉM DOS ESFORÇOS DOS PROFISSIONAIS DA ENGENHARIA AMBIENTAL, HÁ DE SE CRIAR CAMPANHAS DE CONSCIENTIZAÇÃO MAIS INTENSAS PARA PROTEGER O MEIO AMBIENTE, SOBRETUDO A ÁGUA QUE ABASTECE O PLANETA?

Esse é um ponto muito crítico em minha opinião e tenho uma visão bastante radical sobre o que deve ser feito. Primeiro, temos que ter consciência que vivemos em um sistema capitalista global, o qual se sustenta principalmente com exploração dos trabalhadores e do ambiente. Esse sistema não funciona integralmente sem os elementos exploratórios, com objetivo sempre de acumulação de capital. O resultado nefasto é a extrema desigualdade social e os danos severos ao ambiente. Assim, infelizmente, não vejo como resolver os problemas sociais e ambientais dentro desse sistema, pois ele traz a extrema exploração como sua base. No caso do Brasil, assim como de vários países do capitalismo periférico, o problema é bem pior, pois o modelo de desenvolvimento é ainda extrativista, com danos terríveis ao ambiente, além da superexploração do trabalho. A existência de países mais harmônicos do ponto de vista social e ambiental, principalmente no centro do sistema capitalista, mascaram a realidade ao dar a falsa impressão de que os problemas podem ser superados dentro do sistema. As desigualdades sociais e a devastação ambiental, entretanto, nos países da periferia expõem as mazelas desse sistema que leva poucos privilegiados a uma vida digna. No entanto, tenho consciência que a derrubada do sistema capitalista como hegemônico não é factível em curto ou médio prazo e temos que conviver dentro dele buscando mitigar os seus efeitos danosos, ainda que de forma paliativa. Assim, a conscientização sobre o uso correto dos recursos naturais e, principalmente, o letramento científico da população para que entendam as relações de causa e efeito em relação às suas ações e o ambiente, podem contribuir para amenizarmos os efeitos nefastos do sistema produtivo que hoje impera em nosso planeta, tendo o consumismo exacerbado como a força motriz. O consumismo levará à exaustão de nossos recursos naturais se não acordarmos em tempo e não haverá conscientização sobre o correto uso dos recursos que consiga nos salvar de um desastre maior.


DE QUE MANEIRA VOCÊ ENCARA O DESCASO TÃO EVIDENTE EM NOSSO PAÍS EM PROTEGER A ÁGUA CONTRA DETRITOS QUE A POLUEM DE FORMA SEVERA? SABEMOS QUE, NO BRASIL SE LANÇA LIXO DE TODAS AS ESPÉCIES NO MAR, RIOS E CÓRREGOS. HÁ INCONTÁVEIS ESGOTOS SEM TRATAMENTO CORRENDO A CÉU ABERTO. AS CORRENTEZAS DOS RIOS APRESENTAM RESÍDUOS DE MATÉRIA PRIMA DE FÁBRICAS, ENTRE TANTOS OUTROS DESCUIDOS. UMA CAMPANHA DE CONSCIENTIZAÇÃO RESOLVERIA, OU MUITOS CONTINUARIAM TRATANDO A ÁGUA COM NEGLIGÊNCIA, MESMO INFORMADOS SOBRE OS RISCOS DE ANIQUILAMENTO EM QUE COLOCA OS RECURSOS NATURAIS?

O problema é estrutural e depende realmente de estratégias educacionais e de conscientização que coloquem a questão ambiental como central para a manutenção da vida em nosso planeta. Em relação às ações governamentais, temos leis muito boas de proteção ambiental no Brasil, porém sem efetividade na aplicação. Obviamente estamos muito atrasados, principalmente em relação ao saneamento básico. É triste constatarmos que temos menos da metade do esgoto sanitário gerado em nosso país ao menos coletado e uma pequena parte realmente tratada.


COMO GUAXUPEANO, QUAIS AS ORIENTAÇÕES FUNDAMENTAIS VOCÊ DARIA PARA QUE A ÁGUA DA REGIÃO SEJA POUPADA DA DEGRADAÇÃO DA QUALIDADE, OU ATÉ DA EXTINÇÃO?

O acesso à água limpa e segura é um Direito Humano, inclusive reconhecido pela Organização das Nações Unidas (ONU). Portanto, todos e todas devem ter acesso à água, que não pode e não deve ser considerada mercadoria. Partindo desse pressuposto, o recado que deixo aos cidadãos de minha querida cidade, é que façam valer o seu direito, exigindo água de qualidade e de acesso irrestrito. Parece utópico, mas, no nosso sistema político e social, isso está ao nosso alcance por meio de atuação política não somente nas eleições, com escolha de políticos realmente comprometidos com a causa ambiental, mas com a organização em associações de moradores, organizações não governamentais, partidos políticos sérios e com pensamento progressista, além da organização em coletivos. No sistema que vivemos não teremos a questão ambiental como central se não houver muita mobilização social, sempre tendo em mente que as questões sociais e ambientais são indissociáveis.


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