ROSÂNGELA FELIPPE, JORNALISTA
Nascida em Guaxupé, Iara Lúcia passou a infância na fazenda Serra Nova, onde teve a oportunidade de viver intensamente junto à natureza, à família, ao puro e ao belo.
Filha do casal de professores, os saudosos Sr. Moacyr Ferreira e Sra. Dirce Mattos Ferreira, Iara vivenciou, desde muito pequena, o mundo dos livros, das artes, da música, do cinema e dos trabalhos manuais. Toda essa influência justifica o fato de ela ter se encantado e se dedicado à Arte e à Cultura com imensa paixão por meio da Casa da Cultura. E, desde então, mantém suas atividades como incentivadora do artesanato guaxupeano.
TRAJETÓRIA DE VIDA
O primeiro e o segundo anos primários Iara cursou na Escola Rural Serra Nova onde teve a mãe como professora. Foi um tempo mágico. A escola era muito animada com todas as classes ocupando um mesmo cômodo. Os alunos em geral participavam de todas as atividades.
Após esse período escolar, foi matriculada no Colégio Imaculada Conceição onde se diplomou normalista. Foram tempos bons tempos de sua vida! Foi lá que fez as melhores amizades e onde adquiriu mais conhecimento e maiores valores, tanto morais quanto intelectuais. Ela carrega consigo grande reconhecimento e gratidão por todos esses ensinamentos.
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Formada em Letras pela FAFIG, optou por outros caminhos profissionais. Em 1975, começou a trabalhar no Banco do Brasil, em Monte Santo de Minas, de onde saiu em 1981 para se casar com Dr. José Monteiro Felippe da Silva (o Zeca) com quem teve dois filhos que considera com orgulho como ‘maravilhosos’: Leonardo e Laiz. Hoje, além dos filhos, Iara demonstra-se profundamente realizada como avó. Seus netos vieram a acrescentar em sua vida a alegria de poder ter constituído uma família realmente unida e feliz.
A ARTE E A CULTURA EM SUA VIDA
No ano de 1995, Iara se afastou do Banco do Brasil e, no ano seguinte, montou em sociedade com a sua grande e leal amiga Aparecida Cruvinel, a ‘Artemania’, loja de presentes, cestas e afins. Com a doença e morte de sua mãe, ela se desligou da loja e seguiu outros caminhos que lhe trouxeram muita satisfação: o contato com a Arte e a Cultura.
Essa nova e apaixonante etapa de sua vida tornou-se possível graças ao carinhoso convite de seus amigos, o escritor Elias José e sua esposa Silvinha, para que Iara assumisse um dos cargos de diretora da Casa da Cultura.
Com o seu profundo amor por Guaxupé e a preocupação em preservar os aspectos culturais da cidade, Iara procurou colocar em tudo o que fazia muita dedicação, responsabilidade e sentimento. Sempre acreditando que, colaborando com a organização de eventos, estava dando a sua parcela para o conhecimento e o crescimento do povo e da cidade.
ARTE NOSSA
Atualmente, juntamente com um grupo de amigos, Iara é uma das maiores responsáveis pela continuidade da ‘Arte Nossa’ após a desativação da Casa da Cultura. O projeto, que se transformou intensamente em uma das mais belas tradições guaxupeanas, é a maior prova de que o amor pela arte e pela cultura traz benefícios à população em termos de aprendizado, beleza, progresso, no setor turístico e, consequentemente, no âmbito financeiro. Afinal, é um dever reconhecer que Guaxupé é berço de grandes artesãos que muito orgulho vêm dando à história e ao patrimônio cultural da cidade.
Quais os maiores privilégios de ser nascida e criada em uma linda fazenda chamada Serra Nova?
São vários os privilégios, a começar pelo prazer de viver em contato com a natureza, respirar o ar fresco da manhã, sem nenhuma poluição, sentir o cheiro das plantas e árvores e o silêncio que trazia tanta paz a nossa infância. Sem contar a alegria de conviver com os animais e aprender a amá-los.
A interação com a família era muito mais favorável. Vivendo naquele pedacinho do céu (só nós), crescia cada vez mais nossa união. Nossa família sempre foi muito unida.
Você cursou o primeiro e o segundo anos primários em escola rural tendo como primeira professora a sua mãe, Dona Dirce Mattos Ferreira. Quais as lembranças mais marcantes dessa época?
Não é qualquer um que tem o privilégio de ter como professora a própria mãe. Foi uma experiência incrível. A escola foi uma lembrança gostosa, porque a professora (no caso minha mãe) era muito versátil. Fazia teatros, festinhas e ainda montava uma lojinha com vários presentinhos como prêmio para os alunos que respondessem corretamente as perguntas das matérias estudadas. Era uma atividade de aprendizado e prazer.
Ser filha do professor Moacyr Costa Ferreira, considerado um dos educadores mais dedicados e exigentes da história do ensino de Guaxupé, deu-lhe base para que se tornasse a excelente aluna que sempre foi?
Ser filha de Moacyr Costa Ferreira é uma honra. Moacyr Costa Ferreira - professor Moacyr Costa Ferreira - pai. Tive a felicidade de ter os dois em minha vida, um completando o outro. Ele teve uma influência fundamental em minha vida. Pai sempre presente, era verdadeiro professor quando fazíamos o dever de casa. Ele passou muitos ensinamentos tanto de livros como de vida. Passava filmes para aumentar nosso conhecimento e ao mesmo tempo aquilo se transformava numa verdadeira diversão.
Você é formada em Letras pela FAFIG. Porém, seguiu caminhos profissionais diferentes ingressando-se no Banco do Brasil. Essa experiência deu-lhe subsídios para, em seguida, tornar-se empresária de loja de presentes, a ‘Artemania’?
Os caminhos profissionais não tem regras. Nem sempre seguimos a faculdade que fazemos. O Banco do Brasil foi uma escolha totalmente independente da minha faculdade. Assim como ter meu próprio negócio independente do Banco do Brasil. São etapas diferenciadas, mas todas me trouxeram muita satisfação.
Casada com o médico, Dr. José Monteiro Felippe da Silva, vocês geraram um casal de filhos, Leonardo e Laíz. Agora, vieram os netos. Fale um pouco como é ter a casa novamente com crianças correndo pelos cômodos e jardins?
Ser mãe foi uma das maiores realizações para mim. E meus filhos agora me proporcionaram a alegria de ser avó. Isso não tem adjetivos suficientes para qualificar. Os netos correndo, a casa cheia é sinal de vida abundantemente preenchida. Sou muito grata a Deus por tudo isso.
Quem é Maria Angélica em sua vida, além de sua única irmã e a quem você carinhosamente chama de ‘Mã’?
Falar sobre uma irmã simplesmente é uma maravilha, mas falar sobre uma irmã, amiga, companheira, confidente, cúmplice, é falar sobre Maria Angélica. Ela é uma dádiva na minha vida. A doença de nossos pais fez crescer ainda mais nosso relacionamento. É uma cumplicidade única. Maria Angélica é forte, corajosa, otimista e exala uma energia que só me faz bem.
Desde pequena, você se deparou com o mundo dos livros, das artes, da música e dos trabalhos manuais. Foram esses os agentes que a motivaram a se dedicar com afinco à Casa da Cultura?
Cada ser humano nasce com um dom, com um desejo silencioso no coração que se manifesta no decorrer de cada existência. É meu jeito de ser. Gosto de livros, gosto do artesanatos, gosto de botar a mão na massa. Quando o Elias José e a Silvinha me convidaram para fazer parte da Casa da Cultura, nada mais foi do que a realização de meus dons colocados em prática. E como já havia encerrado minhas outras atividades, foi uma alegria poder colaborar.
Como foi assistir o fim da Casa de Cultura após tantos esforços para manter esta instituição de pé?
Nada é eterno. Nada dura para sempre. Ninguém é responsável por nada e nem responde por nada a não ser por si próprio. A Casa da Cultura não morreu. Ela está agonizando. Assim como um dia ela nasceu, ela padeceu; e quem sabe pode renascer.
Quais os eventos mais significativos promovidos pela Casa da Cultura que você julga terem prestado grandes serviços culturais à cidade?
A partir do momento que eu passei a fazer parte, enumero os principais eventos que trouxeram serviços culturais a nossa cidade: "Aconteceu em Guaxupé" foi um evento para reviver episódios e comemorações que Guaxupé viveu no passado. Na verdade, foi uma demonstração para os jovens de hoje conhecer nossa Guaxupé de antigamente e os antigos jovens reviver a sua mocidade. Teatro sobre pessoas que fizeram a nossa história. Criação da Orquestra Jovem, Coral Jovem e Coral Master. Foi fundada a Feira de Artesanato Arte Nossa, uma das maiores realizações da Casa da Cultura e ainda continua sendo. Tiveram muitos outros eventos. Uma página inteira seria pouco para descrever todos.
Impossível falar em Casa da Cultura e não associar a sua imagem ao saudoso e admirável Severo Antônio Silva. O que ele representou para você e para o desenvolvimento cultural de Guaxupé?
Severo foi um grande sonhador. E corria atrás dos seus sonhos até conseguir realizá-los. Com dedicação e total disponibilidade, dedicou a Casa da Cultura com força e garra. O fato de fazer realizar era maior que seus próprios sonhos. Sonhava e realizava. Era de um dinamismo vibrante. Ele representou para mim o homem de coragem para colocar em prática a viva realidade de uma Guaxupé em destaque.
Você acredita que ainda possa surgir alguém como Severo Antônio da Silva com a força necessária para enfrentar todas as dificuldades impostas contra as obras em prol da cultura na cidade?
Gostaria muito de poder afirmar que existe alguém para substituir Severo. Tenho esperança que possa aparecer interessados com coragem de colocar de novo esta ideia em prática. E ainda mais que existisse uma cooperação e interesse de protagonistas e superiores que pudessem expandir o nível cultural de nossa Guaxupé.
Seu amor pela arte e pela cultura é inabalável. Tanto que, com sua equipe formada por amigos e artesãos, o projeto ‘Arte Nossa’ não ‘agoniza’ juntamente com a ‘Casa da Cultura’. Conte como surgiu o propósito da ‘Arte Nossa’? E quais os resultados obtidos durante a época em que as exposições ocupavam os salões da ‘Casa da Cultura’?
Arte Nossa surgiu do desejo de ter um espaço para que os artesãos de Guaxupé e região pudessem apresentar seus trabalhos. Normalmente, são trabalhos lindos, não divulgados e, por isso, não conhecidos. A Casa da Cultura comprometida com seu trabalho em valorizar o que é nosso, abriu as portas para este evento - Feira de Artesanato Arte Nossa. O número de artesãos foi cada dia expandindo mais, tornando a Arte Nossa em uma das melhores feiras da região.
Qual a trajetória que a ‘Arte Nossa’ tem percorrido atualmente e conseguido sobreviver com garra, determinação, criatividade e com a boa vontade dos amantes da arte?
Como não podemos mais fazer Feira na Casa da Cultura, procuramos outros espaços. Assim fazemos a Feira em diferentes lugares, sempre nos dias que precedem o Dia das Mães e o Natal. Temos tido sucesso em todas elas. A perseverança é o nosso lema.
Com tantas mudanças, a ‘Arte Nossa’ vem alcançando sucesso e muita aceitação por parte dos moradores da cidade. Valeu a pena persistir?
Uma das importantes realizações da Arte Nossa foi a criação da Feira permanente. Um espaço com quase todos os trabalhos da Feira, porque nem todos os artesãos fazem parte. É um espaço de lindos trabalhos realizados com carinho. Uma porcentagem de nossas feiras é sempre dedicada a uma Instituição. Atualmente estamos colaborando com a Luz da Vida. Este espaço da Arte Nossa está situado à Rua Francisco Vieira do Vale, 176, e está aberto a todos que quiserem conhecer nosso trabalho, sem precisar esperar as datas comemorativas.
Há novos planos e novos objetivos para o projeto ‘Arte Nossa’?
No momento estamos realizando o sonho de ter a Feira permanente. Mas como o próprio nome indica, arte é inovação e na Feira de Artesanato estamos sempre criando novidades. Em breve mais ideias geniais e fantásticas surgirão.
Nota da jornalista responsável por esta matéria em reconhecimento ao valoroso trabalho de Severo Antonio da Silva em prol da Casa da Cultura:
“Embora tenha progredido muito, apesar de poucos recursos, é sabido pela maioria que o trabalho incansável do saudoso Severo Antonio da Silva e sua equipe junto a Casa da Cultura não obteve o apoio necessário para a manutenção do projeto.
A Casa foi fruto de uma dedicação primorosa e inteligente. Severo lutou até o limite de suas forças. Porém, poucos puderam avaliar sobre o quanto que o espaço necessitava de suporte para acondicionar mais coisas boas, belas e altamente culturais. A Casa tinha quesitos e mentes brilhantes e criativas para preservar lembranças que deveriam e devem ficar para sempre registradas para futuras gerações. Mas sem uma retaguarda financeira, não havia mais o que fazer. O prédio estava se deteriorando. Não havia condições de receber pessoas e tampouco organizar eventos e manter protegidas as peças de exposição. Ou melhor dizendo, a Casa da Cultura se tornou um livro cujas páginas estavam rasgando e todas as suas obras se perdendo em meio às danificações do imóvel. Não havia mais estrutura. Não havia mais ferramentas imprescindíveis para seguir com o trabalho.
Tudo isso é profundamente lamentável, pois, Guaxupé tem muito o que ensinar aos descendentes de todas as famílias que compõe a sua formação e às famílias que vieram de fora e escolheram a cidade como lar. E a Casa da Cultura seria uma escola primorosa para colaborar com muitas informações relevantes sobre a origem, o passado e as diversas fases históricas das ricas jornadas guaxupeanas. Mas não sobreviveu. Talvez, porque órgãos responsáveis pela cultura não tiveram meios de apoiar mesmo que tivessem a intenção de fazê-lo. Mas Severo venceu. Deixou um grande exemplo de dignidade. Lutou com armas pequenas e conquistou grandes acontecimentos a favor da cidade.
Contudo, não se pode deixar de exaltar os comerciantes que sempre colaboraram no que puderam e os moradores da cidade que se propuseram a dar suas contribuições porque tinham condições para isso. Tudo isso valeu. Até mesmo os que nada podiam dar mas torceram pelo progresso da Casa da Cultura.
Mas sempre existe um amanhã. E o sonho de Severo poderá se tornar realidade nas mãos e nos corações de outros que sonham com a evolução cultural de Guaxupé. Pessoas como a Iara Lúcia Mattos Ferreira que vestiu a camisa na luta pela salvação da Casa da Cultura. Ela que é uma mãe zelosa, esposa companheira, amiga leal e carrega um coração do tamanho do universo de Deus.”
(Rosângela Felippe)
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